28/11/2015

A vida é um amontoado de livros


   Estava chovendo. As gotas de água deslizavam pelo vidro da janela, o que fez com que ela, sentada no meio de seu quarto, abraçada aos seus joelhos com força, percebesse aquilo. Ela não havia o superado completamente.
   Afinal, se ela realmente houvesse o superado, por que então estaria tão perturbada naquele instante, em que escutava o céu relampejar? Por que ela estaria tão angustiada? Pensar naquilo a irritou. E a irritou tanto!
   Tudo que ela fizera desde aquele dia fora tentar esquecer, e uma hora ela de fato acabou acreditando naquilo, que o havia esquecido. E só foi ela lembrar que talvez pudesse se encontrar novamente com ele que começou novamente a se iludir.
   Ela odiava o fato de se apegar tanto as coisas e de maneira tão facilmente. Afinal, tudo aquilo não a estaria incomodando tanto se ela não houvesse se apegado a ele. 
   O engraçado é que não aconteceram tantas coisas assim que justificavam o tanto que ela se prendeu a ele. Talvez fosse o momento em que ele apareceu, ou o significado que aquele momento trouxe a ela. Ou também toda a ilusão que ela havia criado em cima dele, baseada em um único acontecimento.
   Para ela, desapegar-se de algo era tão difícil. Era como ter de sentir parte de seu corpo ir embora, afastando lentamente até simplesmente desaparecer. E, em alguns casos, essa ruptura, essa separação era tão imediata que a fazia ficar atordoada. Exatamente como estava acontecendo naquele momento.
   Vê-lo lá foi tão difícil. Talvez nem tanto. Aliás, no instante em que ela o viu, tudo aquilo não foi amargurante, apenas impactante. E foi depois que aquilo foi a corroendo de pouquinho a pouquinho, mesmo inconscientemente, até resultar naquilo em que ela estava sentindo agora, pressionando os seus joelhos com um pouco mais de força. E ela se negou a admitir aquilo, até chegar a aquele ponto.
   Por outro lado, porque sempre temos que tentar ser otimistas, foi naquele momento, quando o viu ali, queimando totalmente a página do meio de seu conto de fadas, que ela percebeu que tudo aquela história era fictícia, e totalmente de sua invenção. Imaginou tanto que acabou chegando a aquele ponto, aonde ela já estava prestes a escrever o final feliz daquele livro. 
   Aquilo a fez abrir os olhos, e finalmente deu-lhe a oportunidade de escapar sem ter que se sentir culpada. Até porque ela, até lá, se sentia um tanto responsável por nada mais ter acontecido. E isso não era verdade, ela percebeu.
   Aquilo a fez abrir os olhos. Pelo menos, agora ela teria de abrir, até porque não teria mais motivos para ela inventar histórias sobre eles. E isso foi a trouxe tanto alivio! 
   Pelo menos desse jeito agora ela não se iludia mais com ele. Com eles. 
   E partisse agora para uma outra história, que talvez nem houvesse começado, ou ainda, que talvez ela estivesse prestes a iniciá-la.
   Afinal, a vida é assim. A vida é um amontoado de livros, de todos os tipos de gêneros. Assim como uma narrativa, elas possuem o desenvolvimento, o ápice e enfim o desfecho de todo a enredo. E quando terminada uma história, deve-se imediatamente iniciar outra. Se você ficar olhando para trás, não verá mais para onde está indo. Vai deixar uma única intriga atrapalhar todas as outras da sequência? 
   Ela só esperava agora conseguir superá-lo completamente. Não que ainda estivesse apegado a ele, porque não estava. Isso ela tinha totalmente certeza. Ela só não conseguia ainda levar toda aquela história com um sorriso no rosto, um sorriso que esboçava o quão feliz ela estava por tudo aquilo ter acontecido. E afirmar com sinceridade que orgulhava de todo aquele livro.
   Mas um dia ela conseguiu. 

2 comentários:

  1. Amei o texto *----* você escreve muito bem May, gostei de verdade ^^

    imaginaivy.blogspot.com

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    1. Muito obrigada Ivy <33. Isso realmente significa muito para mim!!

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